Emmanuela Oliveira 
Na carreira de árbitro, foram dez atuações como membro do corpo de juízes oficiais da IBJJF em torneios mundiais, entre o Mundial de Master, Mundial No Gi e o Mundial dos atletas adultos. Márcio de Deus viajou o mundo vivendo o Jiu-Jitsu na sua essência, enriquecendo o conhecimento técnico na rotina exigente de arbitragem, com possibilidade de assistir, em ação no apito, mais de 100 lutas diariamente. Como professor e líder da TMD House, o faixa-preta é hoje um exemplo de sucesso, com expansão das filiais e alavancada de atletas que se revelam promessas do esporte. Falar de Márcio de Deus sem citar Gabrieli Pessanha é impossível, já que entre professor e atleta se estabelece uma conexão indissociável.
Formar uma atleta desde a faixa-branca e vê-la transpor barreiras históricas, invicta a mais de 100 lutas e dona de um acúmulo de títulos até então inédito, é certamente uma experiência difícil de descrever. No entanto, em entrevista ao VF Comunica, Márcio de Deus se considera um sortudo por poder fazer parte da jornada de Gabi. “Meu trabalho com a Gabrieli é muito pouco, porque a Gabrieli seria uma estrela mundial de Jiu-Jitsu em qualquer lugar.”. Com a conclusão do Pan, com cinco medalhas para a TMD House, Márcio de Deus se mostra ansioso para o Campeonato Brasileiro e o Mundial, ambos da IBJJF.
Leia a entrevista completa abaixo:
VF COMUNICA: Recentemente você anunciou aposentadoria da arbitragem. O que você leva dessa vasta experiência, de anos em atividade, e como isso vai contribuir para o crescimento do time de competição?
MÁRCIO DE DEUS: Eu tive uma carreira como árbitro que considero sólida, de sucesso. Eu tive o privilégio de arbitrar 10 Mundiais da IBJJF nos Estados Unidos, entre o World Master, Mundial No Gi e o Mundial adulto. Atuei no Europeu, Pan-Americano e seis vezes no Pan Kids. Arbitrei também o World Pro nos Emirados Árabes, trabalhando nos principais campeonatos do mundo. Com isso, adquiri muita experiência e conhecimento da regra. Então, isso me ajudou muito também na prática do Jiu-Jitsu, por estar ali assistindo, às vezes, 100 lutas por dia. Por conta disso, é natural que a gente adquira conhecimento. Eu levo isso para a minha vida de professor, sempre falando sobre posições, movimentações, dando detalhes de pontuações, restrições e progressão da luta, já que o principal objetivo do Jiu-Jitsu é a finalização. Graças a Deus, eu tenho tido bons resultados. Dificilmente os meus alunos que lutam são desclassificados ou tomam punições por falta de conhecimento de regras. Então, eu acho que essa minha experiência na arbitragem colabora para que meus alunos possam competir melhor.
VF COMUNICA: Gabrieli Pessanha acabou de ganhar o Pan, peso e absoluto, mantendo uma invencibilidade de mais de 100 lutas. É um feito impressionante. Como é o trabalho para manter esse rendimento em alto nível?
MÁRCIO DE DEUS: Eu costumo dizer que o meu trabalho com a Gabrieli é muito pouco, porque a Gabrieli seria uma estrela mundial de Jiu-Jitsu em qualquer lugar. Prouvera a Deus, eu acredito, dela ter nascido no Jiu-Jitsu comigo. Mas, de forma alguma eu vou dizer que isso aconteceu por causa de mim. Ela é talentosa naturalmente e gosta de treinar, ama o que faz. Ela gosta muito, se dedica muito, abre mão de muita coisa. Então, ela está colhendo os frutos daquilo que ela planta. O meu papel como alguém mais experiente, por ser mais velho, a Gabrieli tem idade para ser minha filha, é de instruir, corrigir, dar um conselho. A gente tem muitos treinos na academia. Graças a Deus temos treinos duros, de qualidade. Treino só de posição, treino só de drill. Tem muitos bons fatores para podermos explorar na TMD House. A Gabrieli consegue se superar com esses feitos históricos, mas é mérito total dela. Eu costumo dizer que eu sou o cara que ajuda no treino dela marcando o tempo. Ela é incrível, o mérito é todo dela.
VF COMUNICA: Quais são os planos da TMD House para o Mundial da IBJJF? Qual é a expectativa da entrada de atletas em números?
MÁRCIO DE DEUS: Já está no nosso planejamento, já está acontecendo. Ainda faltam três alunos resolverem questão de visto, mas já está em andamento. Nesse mês de abril estamos com uma expectativa muito boa, de levar dez atletas do juvenil para o Mundial. A ideia é estarmos na briga. Inclusive, tivemos três medalhas do juvenil no Pan, duas medalhas do juvenil no Europeu. O time está se fortalecendo e nós queremos fazer um bom trabalho com o juvenil. A gente vai com um time de faixas-pretas adultos, todos formados desde a base, devem ser seis faixas-pretas para o Campeonato Mundial. Faixas roxas e marrons também estarão presentes, nós vamos comparecer com um time bem legal. Pela primeira vez, o Luciano Alex, da TMD House de Kansas, nos Estados Unidos, vai levar atletas para lutar, assim como a TMD House da Califórnia. No contexto geral, a Infight tem um objetivo de passar de 25 atletas inscritos no Mundial da Califórnia. Desses 25, provavelmente 20 são da TMD House da Cidade de Deus. Vamos com tudo, essa é a meta. Nós vamos viajar de sete a dez dias antes para um camp bem bacana na academia da Califórnia.
VF COMUNICA: Como você avalia o desempenho da equipe no Pan-Americano?
MÁRCIO DE DEUS: Eu até falei isso nas minhas redes sociais. Eu estou feliz, mas não estou satisfeito. Feliz por ter conquistado cinco medalhas no Pan-Americano, um feito grande, isso é incrível, mas eu sei que a gente pode mais. Quando eu olho para os meus alunos, eu consigo enxergar neles coisas que eles talvez não consigam enxergar em si mesmos. É por isso que eu fico um pouco frustrado, porque eu acredito muito no potencial deles, eu sei que eles podem ir além. Então, foi bom, eu estou feliz, foram três medalhas de ouro no Pan, duas medalhas de bronze, mas eu acredito que vamos melhorar esses números no Mundial, com certeza. Já foi um pouco melhor do que no Europeu, vamos arrebentar no Campeonato Brasileiro também.
VF COMUNICA: Como andam as atividades da TMD House como projeto social? Quais foram as últimas ações feitas em prol da comunidade?
MÁRCIO DE DEUS: Nessas últimas ações, antes da gente viajar para os Estados Unidos, nós inauguramos uma nova turma de crianças que treinam de forma 100% gratuita, ganhando kimonos e apoio de alimentação com cesta básica. Nós abrimos uma turma que hoje está com uma média de 30 alunos. São 30 famílias que estamos conseguindo ajudar. Isso nos deixa muito felizes, é um impacto positivo que estamos causando em 30 famílias. Podem falar que 30 é muito pouco, não é não. Se a gente consegue ajudar 30 famílias, é um número bem significativo. A gente também fez uma ação de busca de vagas escolares, eu pessoalmente fui em algumas escolas, nas regiões administrativas do bairro para colaborar com os pais, para conseguir vagas nas escolas para as crianças que ficaram de fora e tivemos sucesso com isso também. Oferecemos alguns cursos inclusive, entre eles o de empreendedorismo, que foi 100% gratuito, ministrado por um professor universitário da UFRJ, mais de 40 pessoas participaram, entre pais e responsáveis. Até pessoas que não são da academia procuraram o curso. Então, essas foram as nossas atividades mais recentes.
VF COMUNICA: Há muita expectativa da entrada da Gabi no grappling, ela até afirmou que aceitaria com boa vontade um convite para lutar no ADCC. Essa fase da carreira dela está em qual estágio?
MÁRCIO DE DEUS: Eu vou ser muito sincero, posso falar como professor e também como empresário dela, digamos assim, porque a Gabi me dá carta branca para cuidar disso e eu procuro conduzir da melhor forma possível. A gente pensa no No Gi, mas agora é o momento de terminar o Grand Slam. Nós ganhamos o Mundial do ano passado, peso e absoluto, ganhamos o Europeu, o Pan e agora o Brasileiro para fechar, se Deus quiser, vamos trabalhar para isso. A gente fecha o Grand Slam e partimos para o Mundial, depois do Mundial a gente tem alguns planos sim, inclusive estratégicos, a gente pensa em alguns campeonatos No Gi, mas agora eu não vou falar sobre isso. Agora a gente tem que fechar o Grand Slam da IBJJF porque é muito importante. Existem sondagens, mas o foco agora é o kimono e, depois do mundial, a gente vai soltando aos poucos o que pode acontecer.
